Na nova HQ de Jeff Lemire, criador da série Black Hammer, o fim do mundo chegou ― e é totalmente diferente do que imaginávamos
Não espere por meteoros, pragas ou guerras. No universo imaginado pelos aclamados quadrinistas Jeff Lemire e Phil Hester, o fim do mundo tem início num dia qualquer, numa cidade qualquer, quando uma menina de oito anos começa a se transformar numa... árvore.
Para salvá-la antes que seja tarde demais, sua mãe, seu irmão e seu excêntrico avô embarcam numa jornada bizarra e perigosa em busca da cura e de respostas, deparando-se com diversas ameaças pelo caminho, como mercenários assassinos e adeptos de cultos fanáticos, todos dispostos a destruir a menina ou usarem-na para benefício próprio. A cada passo longe de casa, mais a menina-árvore se vê perto de completar essa terrível transformação, correndo o risco de perder para sempre sua humanidade. Ou talvez tornar-se o que nasceu para ser.
Sombrio e impactante, este primeiro volume de Family Tree reúne os quatros fascículos iniciais da série, uma visão única do subgênero conhecido como body horror, ou horror corporal. Mistério, ação e terror se combinam nessa distopia sobrenatural sobre laços familiares indestrutíveis e a força apocalíptica da natureza.
Família. Existem ditados que versam sobre família sendo algo complicado como: “Filhos são que nem puns. Só aguentamos os nossos.”
“A família dos outros sempre parece ser melhor que a nossa.”
“Os desafios entre os familiares nos preparam para a sociedade, porém, os conflitos internos cerceiam a liberdade.”
Enfim, vários ditados. Bom, que o Jeff Lemire sabe trabalhar relações humanas, isso você já sabe. Tanto que uma das maiores qualidades são os diálogos e as relações em palpáveis entre personagens.
E por isso, ele lançou recente um quadrinho que vai abordar dificuldades familiares e segredos dentro das famílias.
Já no início, somos ditos que o mundo inteiro ruiu. Porém, acabamos vendo um flashback de como tudo começou. Nesse flashback, vemos Loretta, mãe solteira que cria seus dois filhos Meg e Josh.
Porém, as coisas começam a ficar estranhas quando Meg nota que seus braços estão virando galhos e seu corpo está assumindo um formato de árvore.
Em um determinado ponto, Judd, o pai de Loretta aparece para ajudá-los. E agora, os 3 estão lidando com um grupo de pessoas que querem matar Meg antes dela virar uma árvore.
Você podem pensar: “Cara, isso é a coisa mais absurda e imbecil que eu já ouvi. Não tem como uma ideia de jerico dessas ser boa!”
Porém, meus amigos, ela é boa. Lemire, mesmo que tivesse decepcionado os leitores lá no fim de Black Hammer, ainda sabe trabalhar os elementos humanos de uma relação.
Royal City e Condado de Essex são dois grandes exemplos de quadrinhos escritos por ele que sabem como construir personagens interessantes.
É possível ver que aquilo que Royal City ainda não explicitou, aqui é mais direto ao ponto.
Loretta, ao ter ficar sem Darcy, seu marido que sumiu há anos com seu pai, ficou abalada e desnorteada. E os desenhos ajudam ver que ela suportou o inferno na Terra.
Sua aparência casca grossa (perdão do trocadilho, vou ali no quintal criar raízes e já volto) é necessária, pois fez de um tudo para ajudar Darcy a voltar ao “normal” e vemos que ele suportou de tudo um pouco.
Josh é o típico irmão implicante. Quem já teve irmão, sabe que ou mais velho te irrita ou o mais novo é quem irrita. Infelizmente, ele não tem muita profundidade e fica sempre em segundo plano. Até quando o avô lhe dá uma arma, a importância do evento é suprimida. Mas quem rouba o show pra si é Meg. Inicialmente, parece só mais uma garotinha comum, porém quando seu corpo muda e a aparência de árvore vai se revelando, é algo fantástico e a garota fica cada vez mais traumatizada.
Alguns até arriscam ir mais longe e comparar com Wytches, do Scott Snyder e Jock, Os Garotos Perdidos e A Morte Solitária de Jordy Verrill, uma das histórias de Creepshow. Consigo ver a parte de Jordy Verrill, onde o tal fazendeiro que tocou num asteróide que lentamente está se transformando em planta e pelo uso do body horror.
O body horror (horror corporal) se dá pela transformação acontecer no corpo e lentamente o transformar em algo asqueroso, repulsivo. Um dos melhores exemplos é A Mosca, remake dirigido pelo mestre do subgênero David Cronenberg, onde um cientista após utilizar seu experimento, tem seu DNA recombinado com o de uma mosca.
Wytches também é possível identificar, pois o traço é sujo e uma mulher surge de dentro de uma árvore e que a transformação dela é algo hereditário, porém sem a mesma necessidade de fazer algo ultra elaborado e num clima até lisérgico como na obra de Snyder.
E o filme Os Garotos Perdidos pode ter relação, pois eles encaram uma road trip até chegar em alguém que os ajude a entender o que se passa com a filha.
Family Tree Vol. 1 é inegável ter boas ideias e uma execução bacana, porém o que vai determinar se a série irá manter-se interessante são os próximos capítulos, explicando os motivos da tal transformação e o tal grupo que os tentou assassinar.
Essa resenha é cortesia do nosso novo colunista especialista em HQs Rafael Da Fonte de Hires.
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